sexta-feira, janeiro 25, 2008

Pensem, imaginem, raciocinem

Pensem bem sobre as acusações que pesam sobre as pessoas presas ontem em mais uma operação da polícia. Foi aqui no Rio de Janeiro, em cidades do interior, região metropolitana, baixada e outras. Leia aqui, aqui, ou aqui. Operação Uniforme Fantasma, da DRACO (Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas) e Coordenadoria de Combate à Sonegação Fiscal, do Ministério Público. Desvio de dinheiro público, licitações fraudulentas, compras superfaturas.

Agora imaginem. Uma pessoa, um cidadão dessas cidades, pobre, necessita de exames específicos para diagnosticar uma doença. Os hospitais não contam com a aparelhagem. Ou os equipamentos estão danificados, sem manutenção. Ou são equipamentos de baixa qualidade, como se comenta nas reportagens sobre o assunto, adquiridos conscientemente. Ou mesmo não há operador, ou estrutura para que tal equipamento funcione. Essa pessoa não consegue realizar tal exame. O tratamento fica comprometido. O estado dela se agrava…

Imaginem também que outro cidadão não consiga atendimento por falta de médicos. É comum quadro reduzido em certas cidades ou falta de especialista em áreas críticas (cardiologia, ortopedia, neurologia, etc.). Ou quem sabe a ausência de atendimento tem por motivo uma greve, paralisação, um grito de profissionais que não suportam mais condições abomináveis de exercer sua profissão. Falta ou atraso no pagamento, salários baixos, carência de materiais e medicamentos básicos. Sem atendimento especializado, a saúde desse cidadão se agrava…

Agora imaginem também uma criança que não tem aula por motivos semelhantes. Professores em greve, carência de profissionais de educação, de materiais de ensino, de instrumentos pedagógicos. Estrutura da escola comprometida. Falta de merenda. Essa criança tem seu desenvolvimento prejudicado. Está aberta a influências negativas que muitas vezes rondam sua vizinhança, sua escola, sua vida. Essa criança começa a olhar para outro lado, seguir um caminho diferente daquele que poderia se o seu direito à educação não estivesse sendo extirpado.

Essa criança, esse cidadão, muitas vezes vive em logradouros onde a coleta de lixo é irregular, quando existe. O saneamento básico é somente uma expressão difícil dos noticiários. Enchentes, esgoto, doenças. O asfalto é uma promessa a ser feita para as próximas eleições. A iluminação pública é algo que consta apenas em sua conta de luz; essa, regular. A segurança é algo somente almejado.

O que é de direito, básico, se torna necessidade, urgência. A sociedade se degrada, as crianças têm seu futuro abreviado. Falta educação, falta saúde, a baixa-estima impera, as cidades morrem, as pessoas padecem, quando não, falecem.

Considerem tudo isso. Raciocinem. Certas pessoas cometem atos, de forma consciente ou por negligência, que promovem o caos, as mazelas descritas acima. Tais atos (com suas conseqüências tão óbvias) caracterizam ou não crime hediondo?

A reportagem num telejornal mostrou parte do material acumulado nos 10 meses de investigações que culminaram nas prisões. Há uma gravação de um empresário negociando a venda de um tomógrafo, com um assessor ou coisa parecida. O empresário fala “Ele quer R$ 140 mil, ele quer ganhar 40% do dinheiro. Tem que ser um negócio bom para todo mundo, até porque é um dinheiro público, não tem dono, né?”

Meu caro empresário corrupto, criminoso, o dinheiro público tem dono sim, e muitos. Como aquele cidadão que teve seu tratamento prejudicado no hospital e teve seu quadro clínico agravado, por carências das mais diversas. Ele é um dos donos. Ah, aquela criança que tem seu futuro comprometido também é dona desse dinheiro. São tantos…

Agora, você empresário corrupto, prefeito corrupto, assessor corrupto, secretário corrupto, vereador corrupto, funcionário público corrupto, ONGs corruptas, vocês são um bando de…

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