quarta-feira, novembro 28, 2007

Through kids' eyes



"Before you talk about education, please feed us.
We need to survive. We are hungry."
Mumina Yusuf, 15

"I would like to tell the rest of the world that we want peace."
Kalson Hussein, 13

terça-feira, novembro 27, 2007

Televisão, Cultura, Preconceito e Ignorância

Há algumas semanas eu ouvi ou li um comentário sobre manifestações racistas no programa do Jô. Pensei: tanta coisa acontecendo nesses dias que precedem o feriado de Zumbi e Semana/Dia da Consciência Negra… Essa é mais uma, talvez invenção ou paranóia. Não procurei me inteirar e ignorei o assunto.

Hoje pela manhã, ao ler a Folha Online, me deparo com a seguinte matéria: Ministério Público Federal investiga programa de Jô Soares. Bastou para relembrar o ‘boato’ e ter a curiosidade aguçada. Com isso, fui eu pesquisar, começando pela leitura da matéria que comenta sobre a suposta manifestação de preconceito no programa exibido em 18 de junho deste ano (quanto tempo!) que traz uma entrevista com um tal de Ruy Moraes e Castro. A matéria traz um link para o vídeo da entrevista, disponível no YouTube (viva a democratização!).

Confesso que assisti ao vídeo estando um tanto tenso com as acusações que estão sendo investigadas pelo MPF. Mas tentei perceber o que se passava. Primeiramente lembrando que o Jô Soares é um comediante e, mesmo em entrevistas com teor, digamos, sério, ele sempre irá adicionar uma pitada de humor. Isso é natural e esperado. E, é claro, a reação da platéia está em sintonia com as palavras e “atuação” do apresentador. Mas natural ainda.

Mas, mesmo tendo isso em mente, não fiquei contente com o que vi. Esse Ruy Castro, que até tem livros publicados, embora tenha descoberto agora, apresenta aspectos culturais de determinadas tribos africanas de forma jocosa e algumas vezes desrespeitosa. Discorre sobre questões de extrema seriedade, como a mutilação genital feminina – MGF –, tão combatida e criticada internacionalmente. Esse aspecto assustador da cultura de algumas tribos da áfrica eu tomei conhecimento através de uma entrevista com a modelo Waris Dirie, que li há muitos anos (Revista Reader’s Digest, acho que de 1999, quando era assinante). Fiquei bastante chocado, da mesma forma quando soube, recentemente, que em certas tribos brasileiras, crianças que nascem com deformações ou mesmo gêmeos, são sacrificadas. Cultura que, quando comparada com a dominante, se torna o que há de mais cruel. Eu considero atrocidades ambas as manifestações, pois meu referencial não é o mesmo. Assim como vejo barbárie nas ações de guerra, nos conflitos diversos onde mulheres são estupradas sistematicamente, pessoas mortas a esmo, crianças usadas como soldados, as bombas atômicas, as políticas que perpetuam a fome de muitos em prol do enriquecimento de alguns, índios e moradores de rua sendo queimados (a propósito, ocorreu novamente).

Mas continuando. Ruy Castro também aborda a sexualidade das mulheres daquelas tribos, fazendo uma associação a meu ver sem embasamento algum (quem sabe alguém me apresenta pesquisa sobre o assunto), entre o penteado e o órgão e comportamento sexual daquelas mulheres. Muitos risos, muitas opiniões controvertidas com imagens sendo exibidas. Algumas daquelas fotos eu já tinha visto, num blog de um angolano que criou uma sessão “Medusas de Angola” como forma de demonstrar, através dos penteados, a diversidade cultural daquela região. Espero conseguir a opinião daquele e de outros blogueiros africanos sobre o caso.

E se não bastasse a forma como a entrevista foi conduzida (como disse, já esperada) e a maneira Ruy Castro expõe seu “trabalho”, o entrevistado, abordando algumas tribos ao Sul Angola, indica uma região que teria fronteira com a África do Sul. Com isso, além da falta de respeito ao tratar de culturas exóticas aos “civilizados de cultura desenvolvida”, ele demonstra sua ignorância geográfica.

Li alguns comentários em sites que exibem manifestações contra o programa, algumas até com petições, repudiando o conteúdo do programa e exigindo retratação - inclusive um site de notícias Português comenta que houve manifestação da embaixada de Angola no Brasil. Mas os comentários, muitos, ilustram o pensamento de que, os que condenam declarações e atitudes racistas ou de cunho preconceituoso com determinada cultura, são “hipócritas neuróticos de baixa estima” com “complexo de inferioridade latente”, como li num site.

As pessoas que usam essas expressões, que pensam assim, ao tentar defender uma posição e amenizar algo que foi tido por outros como insultante ao ser exibido em cadeia nacional, expressam seu próprio preconceito, sua própria intolerância quando o assunto não é de seu interesse direto. Também externam certo grau de medo. Afinal, alguém não está aprovando algo que o fazia rir.

E a essência disso tudo, me referindo ao assunto do programa, é uma: Cultura. As mulheres daquelas comunidades usam um penteado que, a nossos olhos, é mais que exótico, da mesma forma como devem considerar ao ver os “penteados da moda” a que nos acostumamos. Cultura. Mesmo a questão da mutilação genital, a meu ver, assunto que suscita um embate cultural maior e mais importante que o penteado tão comentado no programa, é uma questão cultural, de crença. Repito, não defendo a MGF, assim como abomino o sacrifício de recém-nascidos. Intolerância minha? Não creio. Simplesmente não é, e nunca foi, meu referencial.

Com relação ao programa do Jô, continuo considerando um bom programa, com aspectos positivos e negativos. Não afirmo que houve ou não manifestação racista. O que eu vi foi: desrespeito, preconceito, desperdício de tempo e, certamente, ignorância [expressa e sendo propagada]. Quatro coisas infelizmente comuns na televisão e que não deveriam se repetir. Até porque, embora seja aberta, alguém pagou para que aquilo fosse veiculado. E não se enganem, não foi a Globo nem seus anunciantes.


Dica de leitura:
“Cultura: Um Conceito Antropológico”
de Roque de Barros Laraia.
Jorge Zahar Editor.

domingo, novembro 25, 2007

É fantástico

Comentário breve sobre reportagem exibida a pouco no Fantástico. Título no site, Símbolo do Desmatamento. A matéria é sobre um projeto do Greenpeace que retira um tronco de uma árvore derrubada na Amazônia para que seja exibida no Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília (onde os grandes madeireiros fazem seu lobby). A primeira tentativa, na cidade de Castelo dos Sonhos, Pará, em 16 de outubro de 2007, a equipe passou por situação complicada com pressão de madeireiros. Intimidação sem retoques.

Mas o que me impressionou, apesar de pouco explorado na matéria, foi a falta de autoridade do Estado brasileiro, ali representado pelo Ibama, Exército e Polícia Civil. A equipe do Greenpeace estava autorizada a fazer a remoção da tora naquela cidade e foi impedida por bandidos que não se deixaram dobrar nem pelo Exército Brasileiro. E depois alguns criticam quando reportagens internacionais taxam o Brasil de incompetente em se tratando de preservação da Amazônia.

Conseguiram, enfim, um tauari de 12 metros, em Lábrea, Amazonas, 13 de novembro de 2007. Está em Copacabana, para a campanha Desmatamento Zero. Se depender dessas instituições a contagem até Zero não chega tão cedo. Mas fiquemos de olho!

terça-feira, novembro 20, 2007

Viva Zumbi dos Palmares

Cá estou me recuperando de uma virose que há três dias tenta me derrubar. Com isso, provavelmente não poderei estar presente nos eventos que ocorrem nesta data. 20 de Novembro, ponto alto na Semana da Consciência Negra. Data em que, no ano de 1695, morria Zumbi dos Palmares. Dia da Consciência Negra.

Algo de interessante acontece nesses dias. São muitos eventos para discutir a situação do afro-descendente na sociedade brasileira, trazer e renovar estudos sobre a escravidão, festejar a cultura e a herança cultural africana no Brasil e, mais importante, elevar a auto-estima de boa parcela da população. Ao mesmo tempo, outros escolhem a data e os dias que a precedem para tecer críticas ao elevado número de feriados, ao perigo do "neo-racismo" (essa eu li hoje no site de conceituada revista) e também comentam, alguns de forma calorosa, outros riscos envolvidos quando se trata de integrar, de fato, afro-descentes e outras categorias numa sociedade tão democrática e justa. É mesmo arriscado.

Toda vez que ouço esse segundo argumento, lembro de um filme de ficção que assisti há muitos anos. Tipo Sessão da Tarde. Não lembro do nome. Mas aqui o que importa é o que ficou. Na trama, o herói, protetor da floresta, tinha o poder de se comunicar com os animais, dentre outras coisas. Numa parte do filme, para impedir que um caçador matasse um dos animais, já acoado e assustado, o herói faz com que o caçador sinta tudo aquilo que o animal estaria sentindo no momento. O caçador chora, cai aos prantos, implora para que aquilo acabe. Parece uma comparação idiota, talvez até seja (sou mestre nisso), mas penso que seria muito interessante se aqueles que fazem críticas como o fato de uma parcela da sociedade brasileira reclamar igualdade, estivessem do outro lado. Imaginem só.

Muitos apresentam pesquisas acadêmicas, dados do IBGE (que cada um interpreta como quer) e até relados, para comprovar que tudo caminha para um paraíso de igualdade e que o problema estaria nas políticas de ação afirmativa, no feriado, nas passeatas, nas cotas, que racismo é achar que racismo existe, que tudo isso é esquerdismo de baixo nível... Por que será? Isso sem falar nos comentários postados em artigos sobre a Semana da Consciência Negra, no O Globo On-line, por exemplo. Sempre digo que os comentários expressam muito do que muitos sentem.

Mas isso não apaga a importância da data, deste tão criticado feriado. É simbólico, sim, como tantos outros, mas mantem sua importância. Reflexão, conscientização, estudo, respeito, orgulho, auto-estima, inclusão, igualdade de fato (já que de direito está assegurada no Artigo 5° de nossa Constituição), reconhecimento.

E que venham as críticas.


sábado, novembro 17, 2007

Estejam mais avisados ainda

No embalo da Semana Nacional da Consciência Negra e comemorações do dia de Zumbi dos Palmares, gostaria de divulgar mais dois eventos. Além do já comentado II Festival Afro, acontece:

Na UFRJ
A Faculdade de Letras da UFRJ, numa realização em parceria com a UFF e a Fundação Biblioteca Nacional, realiza o III Encontro de Literaturas Africanas - Pensando África: crítica, pesquisa e ensino. O evento acontece de 21 a 23 de Novembro. Para maiores informações clique aqui.

Na ABL
A Academia Brasileira de Letras vai reunir em sua sede especialistas de várias partes do mundo, de 22 a 24 de Novembro, para debater as diversas formas históricas de escravidões na Conferência “Confrontando as Escravidões” – Um diálogo visando ao entendimento cultural. Para maiores informações e programação completa, clique aqui.

Alguns dizem que tais eventos acadêmicos têm um propósito mercadológico, tendo em vista a Lei 10.639 e atribuem isso, também, como motivo para o grande número de publicações sobre África e afro-brasilidades. Prefiro pensar que o que ocorre é um engajamento, cada vez maior, para mudar um quadro de invisibilidade e ignorância de cultura afro-brasileira e africana. Bem, de qualquer forma algo de bom acontece. Estão, finalmente, tocando no assunto.

quarta-feira, novembro 14, 2007

Atenção nunca é demais

Em 2003, a revista Super Interessante trouxe como matéria de capa a reportagem “Como Hitler pôde acontecer?” Um cara baixinho, com um bigode exótico, cuja aparência, em seu conjunto, fugia daquilo que pregava ser característica de raça superior. Fazia aquele penteado esquisitão, comportava-se de maneira mais esquisita ainda e, como ninguém é perfeito, ainda tinha algumas idéias bem escrotas. Mas ele “aconteceu” e deixa seu rastro podre até hoje.

A reportagem fazia um histórico do surgimento à decadência dessa figura. E a primeira conclusão, talvez óbvia, é que esse tipo de gente não surge do nada. São eventos, atitudes, palavras, acontecimento que se sucedem e… lá está ele. Será que foi tão discreto ao galgar os degraus que o levaram até o poder? Não. Não houve discrição. Ele vai mostrando a que veio para aqueles que querem ver. Alguns, descrentes, o ignoram. Outros ficam mais atentos. Mas o fato é que o bigode chegou onde queria.

Mas de quem seria a responsabilidade em perceber que algo acontece? A quem interessa? E será que haverá, digamos, sensibilidade para sacar que alguma coisa está para acontecer? Será que os acontecimentos serão analisados de forma objetiva, com isenção e abrangência suficientes, além de critério que permita prever algum evento?

Parece que esse tipo de análise só é levado em consideração décadas depois dos ditos eventos. Revirando os arquivos, sacudindo a poeira dos papéis, tendo acesso e meios para uso e análise de certas informações, acontecimentos do passado (que ainda ardem no presente) são revistos.

Hoje, a edição eletrônica do Guardian Unlimited traz um texto de Sir Ian Kershaw, professor de história moderna Alemã, da Universidade de Sheffield, intitulado Blind optimism, em que comenta o livro A mirror of Nazism: British opinion and the emergence of Hitler, 1929-1933, de Brigitte Granzow. No artigo, o professor que publicou uma biografia de Hitler (em dois volumes: Hitler, 1889-1936 Hubris e Hitler, 1936-1945 Nemesis), obra monumental – somam mais de 2000 páginas - que lhe rendeu varias premiações, analisa a “cobertura” que os jornais The Guardian e Observer deram a Adolf Hitler de 1930 a 1933. Alguns links levam a reproduções digitais desses jornais, onde podem ser lidas as matérias originais.

Reportagens que traziam distorções e interpretações equivocadas acabaram por minimizar a ascensão do líder nazista. Diziam que era apenas uma figura "dramática", um carinha cheio de "verborragias revolucionárias" e "sem verdadeiramente ser um líder revolucionário". Um "charlatão" de "postura moderada" que, talvez viesse a ser tornar um homem de Estado. E era "definitivamente cristão em seus ideais", que iam "de encontro aos da Igreja Católica Alemã". Essas são algumas das percepções que foram veiculadas à época em jornais importantes da Inglaterra.

Parece que menosprezaram as verborragias de um pseudo-revolucionário charlatão. Deu no que deu. Mas fica a lição.

terça-feira, novembro 13, 2007

Educação: um risco

No dia 6 de novembro, publiquei um texto no Jornal de Debates, numa proposta de discussão sobre educação. A proposta era “Por que a educação não tem prioridade no Brasil?”. Intitulei meu artigo com outra pergunta: “A quem interessa?”. Basicamente falo de dominação a partir da [falta de] educação. Poucos dias depois, 11, assisti no Fantástico uma reportagem que, embora, infelizmente nada tenha de novidade, me deixa triste e indignado.

Escolas caindo aos pedaços” foi o nome da matéria. Apresentou escolas do Maranhão (me lembrei de um imortal), Minas Gerais (onde tem um que quer ser e um que já foi), Alagoas (me lembrei muito do Renan) e Mato Grosso (riqueza, agronegócios, etc.). Estados onde oligarquias parecem resistir ao tempo.
Eram escolas municipais e estaduais. Públicas. Ensino fundamental. Na definição, fundamental é o que serve de fundamento, básico, base, alicerce... para o futuro. Futuro sem janelas, paredes ou teto. Futuro aos pés de uma mangueira. Ao sol, ao vento e ao relento. Fiquei pensando na falta de papel higiênico, estrutura, vazamentos, e outras características de universidades públicas. Uma evolução. Pelo menos as aulas ocorrem numa sala, com paredes e tudo o mais. Que sorte! Será que é uma gradação do sistema educacional vigente?

Recentemente também li algo sobre o Laptop, que pelo visto não sairá mais a 100 dólares, e que o governo pretende adquirir aos milhares. Isso, pelo visto, no âmbito do PDE (Plano de Desenvolvimento da Educação). É tanto plano. Alguns podem ser definidos como “fazendo algo que já deveríamos ter feito, pois consta na legislação”. Ainda têm esse negócio de um computador por aluno, todas as escolas conectadas à Internet. Que maravilha.

Realmente estão planejando o nosso futuro. Ah, e com certeza o plano contempla questões como profissionais habilitados para o ensino com essa “nova” ferramenta, assim como a manutenção desses equipamentos. Ambiente adequado já existe: à sombra de uma mangueira. É um risco.


Explicando o título desta postagem
Risco tem um duplo sentido. O primeiro como sendo algo arriscado. Se relaciona ao risco que para alguns representa a democratização do ensino, da educação, do cultivo do pensamento, do desenvolvimento da crítica. É arriscado uma vez que pessoas "educadas" tendem a contestar o que lhes está sendo imposto. No mesmo sentido é o risco que aquelas crianças e seus professores-heróis correm - primeiro ao ficarem tão expostos à precariedade daquelas estruturas, com quadros sendo derrubados pelo vento, que também derruba mangas nas cabeças dos alunos; depois por ficarem expostos a um futuro sem perspectiva, uma vez que o status quo está sendo mantido.
O segundo sentido seria no mesmo contexto de riscando do mapa. Eliminando, apagando, enfraquecendo. Seria, na verdade, uma espécie de ação (revestida de políticas públicas falhas) do primeiro sentido. Para não correrem o risco... riscam a educação do mapa.
Ajudar funciona (?)

Muito se discute sobre o real impacto que a ajuda (financeira) internacional tem no continente Africano e noutros países dos demais continentes. Sobre África, o que vejo de comentários se resume basicamente a corrupção de alguns chefes de Estado que acabam por desviar o dinheiro doado, ou aplicando de forma errônea, logo, sem impacto no desenvolvimento local e na redução da pobreza. Isso sem falar nas “pesquisas” que dão um tom racista na visão que alguns países desenvolvidos têm do continente Africano, relacionando a cor da pele com pobreza, desmerecendo todo um universo cultural de extrema riqueza, e desconsiderando a História. Com isso, concluem secamente que ajudar não adianta.

O mais correto, a meu ver, seria dizer que a forma atual de ajuda, aonde cada dólar chega impregnado de interesses comerciais, políticos, estratégicos, realmente não adianta. É bom esclarecer que a ajuda a que me refiro é aquela conhecida como ODA (Official Development Assistance) que, na definição de sua entidade criadora, o Comitê de Assistência ao Desenvolvimento (DAC) da Organização para Co-operação Econômica e o Desenvolvimento (OECD) seria um fluxo de financiamento oficial a ser aplicado com vistas ao desenvolvimento econômico daqueles países e o bem estar de sua população. Mas, como nada é perfeito, os interesses aos quais me referi, tanto dos doadores como também nos países que recebem a doação, acabam por enfraquecer o objetivo da ODA. Quem sofre, é claro, é quem mais precisa.

É uma situação complicada e pouco discutida de forma aberta. Mas, vamos à indicação de leitura. Um relatório recente do IPC, em sua publicação Povert in Focus, e intitulado “Does Aid Works? – for the MDGs” trás alguns artigos que examinam esse sistema internacional de ajuda, apresentando propostas de ajuste que possibilitariam aplicação mais eficaz.

A publicação pode ser obtida clicando aqui.

sexta-feira, novembro 09, 2007

Na van

Estava eu indo à Mesquita (a cidade, não o templo) e, como quase sempre, fazendo uso do transporte alternativo. Não que eu seja afeito a Vans, mas o transporte oficial que liga Mesquita ao Centro do Rio, mais especificamente à Praça Mauá (dando nome aos bois: linha 005 e 131; empresa: Transmil), não atende a população. Ônibus precários, longas esperas e alto custo da passagem, contribuem para que o oficial perca para o oficioso. Sinceramente, ambos deixam a desejar.

Pois bem, conversas em transporte público, alternativo ou não, muitas vezes são interessantes. É bem verdade que, na maioria, são caóticas, deprimentes, incômodas. Mas a que me refiro, que poderia muito bem ser tema de um estudo, tem haver com ética, corrupção, conceitos e outras coisas mais que se possa extrair daquilo tudo.

Van cheia, sem cabeça para ler um livro (espécie de salva vidas, sempre próximo) as conversas, ou melhor, a conversa, preencheu o tempo. Não participei. Apenas ouvi e me impressionei. Falavam sobre energia elétrica. Mais especificamente sobre o furto desta, o famoso “gato”. “Em minha casa existe um leão”, dizia um, o mesmo que dava as dicas para um “gatobem feito. “Você não pode sair de uma média de 40, 45 reais e reduzir logo pra 20. Eles desconfiam”. Tudo isso numa naturalidade…

Também criticaram a nova tecnologia de medidores da Light, que os instala em postes e agrupados, e não internamente. Isso faz com que o acompanhamento (sic) pelo consumidor fique comprometido, uma vez que a checagem das informações do relógio fica dificultada pela distância. Da mesma forma, tal mudança gerou um aumento nas contas, fazendo com que muitos consumidores revoltados destruíssem, literalmente, os medidores. Isso eu vi. Ateavam fogo. Como se o medidor representasse o responsável na Light. Era a vingança da população, que não vê resultados nos meios disponíveis para reclamações.

Mas voltemos ao bate-papo no transporte alternativo. Outra maneira de furtar energia foi comentada. Essa me impressionou ainda mais. Tratava-se, grosso modo, de interromper o movimento do relógio, por travamento do disco. Da mesma forma, as técnicas eram apresentadas e discutidas com extrema naturalidade. Um apresentando ao outro, maneiras de sobrevivência. O jeitinho.

Quero deixar claro que sou contra o “gato”. Já fui vítima, durante mais de um ano, quando foi desfeito (não foi descoberto, mas desfeito) e a conta teve redução de 40%. Assim, de uma hora para outra. O caso foi apresentado à Light, mas ficou provado o desprezo. O furto era indireto.

Quando comentamos sobre corrupção, normalmente o alvo é Brasília. Onde algumas centenas de funcionários públicos, pagos para representar a maioria da população, atuam em benefício próprio. Puro reducionismo de algo bem mais amplo. Uma de minhas primeiras postagens aqui no blog dizia respeito binômio ética-moral. Foi um texto onde comentei o aumento de salários que os parlamentares estavam se dando. Aumento esse que, por sinal, voltou à pauta da Câmara, nesses tempos de barganha pela CPMF.

Mas a cada conversa que presencio, a cada declaração que ouço, não de parlamentares, mas dos que os elegeram, me faz acreditar que se alguns eleitores tivessem a oportunidade de seguir carreira pública, se comportariam da mesmíssima maneira que os ladrões tão criticados. Corrupção de baixo para cima, de cima para baixo, de um lado para o outro.

O “gato”, pelos que fazem, não é considerado como furto de energia, como crime, assim como o desvio de verba pública é tido como normal por alguns. Pensam eles que, se a concessionária de energia elétrica presta um serviço aquém do que se espera, têm o ‘direito’ de roubá-la. O fato de prejudicar o vizinho, quando o gato é feito indiretamente, ou mesmo de comprometer todo o sistema (segurança, preços, etc.), quando o roubo se dá na alta tensão, no poste, não causa nenhum constrangimento a tais pessoas. O respeito com o próximo inexiste. A consciência do coletivo é uma piada. Essas são as mesmas pessoas que, ao lerem os jornais, quando o fazem, xingam seus iguais, em Brasília.

E para dar outro exemplo dessa mentalidade, sem sair da Van, basta que nos lembremos das saídas de ar-condicionado (quanto existe) na primeira fileira de bancos logo atrás do motorista. Quando a temperatura está alta e esse conforto é mais apreciado, quem senta ali, direciona as saídas para si, sem pensar (ou mesmo de forma consciente, pois o mal existe) naqueles que se encontram nos últimos bancos.

A Van está cheira. E eu também.

quinta-feira, novembro 08, 2007

Haja coração!

Eis um ano inesquecível: 2007. Um ano, como qualquer outro, onde tristezas e alegrias se sucedem, com emoções novas a cada dia, risos e lágrimas, de alegria ou não. A vida é formada de perdas e ganhos. E neste ano essas palavras ganharam mais significado, como se o coração fosse marcado a ferro em brasa para defini-las, de uma vez por todas. Espero, sinceramente, que acontecimentos tão intensos cessem daqui para o fim do ano. Chega, por enquanto.

No espaço de dezenove dias, a morte e a vida se materializaram em minha frente, desafiadoras, exigindo ação, atitude, força… e também permitiram reflexão. Refleti sobre a vida e a morte, força e fraqueza, sobre esperança e desilusão, sobre violência e paz, sobre família, sobre passado, presente e futuro.

Em 07 de Novembro de 2007, nasceu minha sobrinha. Presenciei a vida chegando com força, num presente de 3.315gr distribuídos em 50cm de esperança num futuro de paz.
Seja bem-vinda, Júlia!

terça-feira, novembro 06, 2007

Estejam avisados...

De 21 a 25 de Novembro acontecerá no SESC Tijuca o II Festival Afro, como parte das comemorações da Semana da Consciência Negra e homenagens a Zumbi dos Palmares. E o patrocínio da Petrobras (órgão do Ministério da Cultura) garante a entrada gratuita.

"O Projeto II Festival de Música, Dança e Cultura Afro-brasileiras consiste na realização, na cidade do Rio de Janeiro, de espetáculos de música e dança, oficinas culturais, um seminário e uma exposição de artes plásticas e uma exposição fotográfica que darão ao público carioca uma mostra da rica herança cultural que o povo de origem africana legou ao nosso país. Seu objetivo é contribuir para a promoção e divulgação da cultura de raiz afro-brasileira, abrindo espaço também para a discussão e o debate sobre a cultura negra no Brasil de ontem e hoje." Para maiores informações clique na imagem abaixo.


Formas de tratamento

Há poucos meses foi uma empregada doméstica. Alguns dos criminosos alegaram que pensavam se tratar de uma prostituta. Postei sobre isso aqui . Agora parece que acertaram, pois desta vez o alvo foi realmente uma prostituta. O cenário, mais uma vez, a Barra, mas poderia ter sido em qualquer lugar. Os "protagonistas" mais uma vez jovens de classe média alta, que vivem no conforto e relativa segurança dos condomínios da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.

Já ia esquecendo o motivo: o desprezo pela vida, pelo próximo; e, é claro, a sensação de impunidade. Uma matéria do O Globo Online fala sobre a falta de valores, a infantização, e isolamento social desses jovens. São realmente fatores que contribuem para a formação desses que, tendo estudado em boas escolas, com oportunidades para se profissionalizarem e com todos os recursos de que dispõe, são os mais cotados para ocuparem postos de comando num futuro próximo.

Uma coisa que acho bem interessante ao fazer uma busca sobre as notícias relacionadas a esse, digamos, incidente. É como esses criminosos desumanos, de 21, 19 e 17 anos, são chamados. Jovens, estudantes, garotos, rapazes. Pode parecer paranóia, mania de perseguição, cisma… Mas gostaria que fizessem uma comparação com notícias similares (isto é, homens, de 17 a 21 anos, que cometem crimes) em áreas não tão nobres quanto a Barra da Tijuca e, mais importante, oriundos de camadas mais pobres da população. Baixada Fluminense, morros e favelas (as comunidades) da cidade do Rio, isso para ficar somente neste Estado. Os adjetivos e formas de tratamento não serão tão amenos, disso tenho certeza. Notem que aqui eu nem estou considerando a tez dos indivíduos.

É. A desigualdade passa também pelo tratamento.
Sem querer causar intriga

Cá estou, em horário de almoço (isso, na verdade, não existe) no escritório. Sala de fundos, de cara para o que ficou conhecido como o "Triângulo das Bermudas" - local onde fica a sede da Petrobrás, o BNDES e o prédio do antigo BNH - pois é onde o dinheiro do Brasil desaparecia, dizem.

Pois bem, os protestos, como tenho percebido, são constantes. Algumas vezes fica difícil me concentrar no "trabalho". No princípio eu ficava curioso, mas agora parece que é normal, não é mais uma novidade.

Hoje, por exemplo, resolvi observar um pouco a manifestação de um dos sindicatos. A primeira coisa que reparo é o baixíssimo quórum de funcionários em frente ao famoso Edise, como é conhecido o Edifício Sede da Petrobrás. Alienação? "Sou terceirizado, não tenho nada com isso"? Falta de engajamento? Acomodação? Um direito (já que a associação é livre)? Sei lá! Mas centenas de funcionários saem para o almoço ou outras tarefas. A maioria pela lateral, isso fica claro; alguns pela portaria principal. Uns poucos param, depois seguem. A polícia, é claro, está presente.

Cada um que pede a palavra, pelo que ouço, é alertado sobre o limite de 3 minutos. Alguns usam poucos segundos para tentar gritar palavras de ordem (muitos sem sucesso), outros falam um pouco mais. É uma expressão democrática. A representatividade do trabalhador deve existir, tem sua importância. Aqui vejo uma manifestação constante, que faz uso de simbolismos como urna funerária, pessoas baixando as calças, e apitos, muitos apitos, simultâneamente às declarações dos que pedem a palavra. Uma cacofonia, uma miríade de sons que, no conjunto, se mostram, por vezes, inexpressívos, apenas incômodos. Mas são válidos. As reinvidicações fazem parte dos direitos dos trabalhadores. Devemos reinvindicar, brigar por nossos direitos, lutar por transparência e respeito nas relações trabalhistas.

Infelizmente a questão sindical parece ter tropeçado no corporativismo. O que, se por um lado fortaleceu a empresa sindicato, enfraqueceu o objetivo maior, que é a união dos trabalhares em prol do bem comum da categoria. A política, ou melhor, a politicagem, também contribui negativamente. Tenho lido sobre os projetos que envolvem a instituição Sindicato, como no caso da contribuição sindical. Muitos bradam contra o governo Lula, parecendo, assim como o próprio Luiz da Silva, padecerem de esquecimento agudo. Talvez, na euforia em eleger um "real representante do povo, do trabalhador", não consideraram o dia depois da eleição. Mas tudo bem, errar é humano.

Continuamos, então, bradando, gritando palavras de ordem, pedindo a palavra por 3 minutos... e, sempre que possível, arriando as calças.

A menina no mercado

Havia uma menina no mercado. Devia ter uns 12 anos. Talvez menos. Estava atrás de mim no caixa. Tinha dois pacotes de macarrão instantâneo n...