sábado, outubro 30, 2010

O exemplo do palhaço

Ele teve um número recorde de votos, independente das razões e motivações de seus mais 1 milhão eleitores. Ainda não foi empossado e a polêmica continua com indícios de que não seja alfabetizado. Esse é mais um capítulo dessa novela que é a vida pública e política no país. Não posso deixar de dar os meus pitacos. Longe de mim tentar resolver. A intenção é usar a notícia. E farei isso de 5 modos.

1° - A culpa não é do analfabeto. Ao contrário do Luiz da Silva, não vou exaltar a falta de estudos. Isso não é algo para se ter orgulho. Mas uma coisa não podemos negar: a roubalheira, a falta de ética e moral, o desrespeito com o bem público, os crimes que acontecem na vida política brasileira não são cometidos por analfabetos! Muito pelo contrário. As Vossas Excelências, que tanto nos envergonham, que tanto nos roubam, que exaltadamente bradam suas virtudes e suas imaculadas inocências na tribuna, são em sua maioria doutos e distintos cavalheiros e damas, com seus diplomas, muitas vezes obtidos em cursos conceituados em universidades respeitadas.

2° - Relacionado ao primeiro.... Façamos um exercício mental. Vamos imaginar que no lugar do palhaço tivéssemos um latifundiário ou um empresário conhecido. E, ao invés do analfabetismo, o que estaria em jogo, o que teria de ser provado, seria sua honestidade e capacidade ética e moral para exercer o cargo. Será que haveria tanto furou das autoridades? A resposta é simples: não. Isso é ficção. O desonesto, o canalha, o bandido, pode ser latifundiário, empresário ou até mesmo palhaço. Basta saber ler.

3° - Será que uma exigência dessas faz sentido quando se permite... bem, os anúncios abaixo falam por si. Vale ressaltar que sempre destacam “reconhecido pelo MEC”

4° - Esse processo para provar se é ou não alfabetizado é uma verdadeira palhaçada! Deem um jornal nas mãos dele e peça que leia em voz alta (analfabeto ou não?) e comente uma notícia qualquer (funcional ou não?). Ah, mas isso não seria... justo (?). Além de não dar a devida audiência.

5° Agora puxando a bola para o lado informacional da coisa. Existem reportagens investigativas sobre a vida escolar do humorista (um exemplo aqui). Pelo visto não encontraram documentação comprobatória de sua vida escolar. Até aí tudo bem, não seria, se fosso o caso, a primeira pessoa a se alfabetizar longe da sala de aula. Mas o estranho, e até criminoso, é essa ausência de documentação. O histórico escolar, se não me engano, é documento de guarda permanente. Mesmo uma escola fechando, esse documento deve ficar sob tutela do Estado. Num quadro ideal de gestão da informação, respeitando a legislação vigente, uma informação objetiva deveria ser fornecida pela Secretaria de Educação do estado de origem. São inaceitáveis declarações do tipo “não encontramos o documento”. Deveriam simplesmente informar SIM, existe documentação e está em tal lugar, ou NÃO, não existe registro.
Eleições 2010

Está quase no fim. No domingo à noite já teremos escolhido os traseiros que ocuparão a cadeira da presidência durante os próximos quatro anos. O plural é proposital, pois sabemos que é sempre um grupo que vai ao poder.

Evitei (e evito) entrar nas discussões que ocorrem nos lugares e momentos mais inadequados sobre quem seria melhor ou pior para o Brasil. Seja no trabalho, algumas vezes de forma desrespeitosa; seja durante um jantar na casa de amigos; nos infindáveis e-mails que desafiam os recursos anti-spam e filtro (nunca os usei tanto); seja nas redes sociais com uma quase imposição a leituras das mais diversas que “comprovariam”, com a mesma paixão, as falcatruas de um ou de outro candidato; até mesmo em festa de criança...

De qualquer forma, por mais que me incomode a maneira e principalmente os lugares e momentos nos quais esse tipo de discussão é levantado, é ótimo saber que podemos discutir, que podemos nos posicionar. Essa tal liberdade também ajuda a descobrirmos até que ponto nossa liberdade incomoda. É curioso. Ás vezes penso que meu silêncio incomoda tanto, ou mais, que o barulho de outros. Liberdade de expressão, de escolha, de posicionamento político, filosófico, religioso, intelectual... liberdade! Mas creio que existe momentos e lugares para exercermos esse direito básico, sob o risco de desrespeitar o direito do próximo.

Recentemente uma amiga que trabalha num sindicato me ligou e num determinado momento o rumo da conversa foi (ela direcionou) para a questão eleitoral. O simples fato de não ter me posicionado a favor de um dos lados (nem do outro) bastou para que ela se espantasse. Foi muito engraçado. Ela praticamente me ameaçou com “um monte” de e-mails, com certeza com o mesmo conteúdo daqueles que citei no início e que venho ora bloqueando, ora filtrando e sempre deletando.

Creio que seja comum, numa relação de amizade, esperarmos pensamentos similares. Mas aprendi que a visão de mundo (o posicionamento político, filosófico, etc.), mesmo de um amigo, por mais íntimo que seja, é sempre carregado de subjetividade, de influências ao longo da vida, de experiências. E, bem, minhas influências e experiências foram diferentes das de minha amiga. E com certeza nossa amizade não é posta à prova a cada quatro anos.

O fato é que na próxima semana os assuntos mudam... um pouco. As discussões seguirão outro rumo. Provavelmente o futuro. Os próximos quatro anos. Mas quatro anos de construção. Será uma sequência, independente de qual grupo assuma, pois o que somos hoje começou ontem, assim como o que fomos ontem começou bem antes.

domingo, outubro 10, 2010

Uma lei, uma luta, uma fruta

Que fique claro: não sou nenhum puritano! Posto isso, permitam-me destilar talvez um preconceito, talvez um incomodo, talvez uma inquietação ou mesmo curiosidade.

Hoje, ao ler uma nota curta num jornal sobre uma certa mulher, nascida a pouco mais de 20 anos, me veio a mente outra mulher, cuja luta começou anos antes do nascimento da primeira. A luta a que me refiro teve e tem sua importância não apenas para ambas, mas para todas as mulheres. E, por que não dizer para todos nós, independente de gênero?

A primeira mulher, conhecida por seus dotes físicos (é realmente impressionante!) e..., bem, creio que só. Penso que foi uma das precursoras na adotação de pseudônimos frutíferos (com trocadilhos, por favor). Atualmente está em evidência num reality show que, pelo menos para mim, não tem relevância alguma. Isto é, nada que acrescente ou possa acrescentar algo na minha vida (só na minha?). Não posso dizer que seja a única razão para que eu não assista o tal programa. Mas não vem ao caso comparar com outras porcarias que já assisti. É claro, sempre é possível fazer alguma reflexão psicológica, sociológica, antropológica ou seja lá o que for.

A segunda mulher, como adiantado no início, é conhecida por sua luta. Abaixo um resumo, retirado do site do Projeto AME.

Em 1983, Maria da Penha recebeu um tiro de seu marido, Marco Antônio Heredia Viveiros, professor universitário, enquanto dormia. Como sequela, perdeu os movimentos das pernas e se viu presa em uma cadeira de rodas. Seu marido tentou acobertar o crime, afirmando que o disparo havia sido cometido por um ladrão.

Após um longo período no hospital, a farmacêutica retornou para casa, onde mais sofrimento lhe aguardava. Seu marido a manteve presa dentro de casa, iniciando-se uma série de agressões. Por fim, uma nova tentativa de assassinato, desta vez por eletrocução que a levou a buscar ajuda da família. Com uma autorização judicial, conseguiu deixar a casa em companhia das três filhas. Maria da Penha ficou paraplégica.

Tendo o que pode ser considerado preconceito [meu] sido exposto parágrafos acima, agora vamos ao que me incomoda, ao que me inquieta, vamos a minha curiosidade. O que pensaria a segunda mulher, a mulher da luta, ao ouvir a primeira mulher declarar “Eu gosto de homem que bate, sabe?”?

Preferência sexuais à parte, não pude deixar de pensar no que significa para as tantas mulheres que sofreram ou sofrem violência doméstica ouvir em cadeia nacional algo desse tipo. Bem, conhecendo a personagem, surpreenderia se usasse a oportunidade para alguma declaração conscientizadora e relevante sobre essa temática. Mas eu entendo. Isso não traria frutos (com trocadilho), não daria audiência.


segunda-feira, outubro 04, 2010

Quebrando o silêncio

Admiro muito os escritores, jornalistas, cronistas e blogueiros. Gostaria de escrever mais, com mais constância, com mais regularidade. E também gostaria de produzir textos melhores, mais bem escritos, aprimorando a cadência com que as palavras são lançadas do início ao fim, sem deixar que as ideias expostas percam a coerência.

Além da admiração, tenho profundo respeito pela arte da escrita. É uma arte, talvez como todas as outras, terapêutica. Sim, muitas angústias são extirpadas junto com a derradeira palavra no texto. Em outras postagens cheguei a comentar o que representa, para mim, o ato escrever, e mais especificamente o que escrevo neste blog.

Por isso, esses mais de trinta dias sem que uma única nova linha fosse acrescentada ao TUIST me deixam com certa frustração. Uma sensação de fracasso, para ser extremo. Sei que não há nenhum compromisso formalizado, ou promessa de escrever tantas postagens ou tantas linhas de texto por semana, por mês. Mas não adianta.

Certa vez, durante uma das muitas conversas em mesas de bar, uma amiga contou a um jornalista amigo que eu estava me aventurando na blogosfera. Embora não tenha usado as mesmas palavras, ele me fez uma única pergunta: “Qual a periodicidade com que você publica os textos no seu blog?”. Creio que na época eu tenha respondido “uns 2 por semana”. Não me recordo. Mas qualquer que tenha sido a ordem de grandeza apresentada, eu menti. Bem, não foi realmente uma mentira, pois acreditava que poderia produzir textos com a periodicidade que bem entendesse. Pura arrogância de um novato.

Mas eu estava numa fase em que a natureza de meu trabalho me permitia momentos para isso. Ócio, reflexão, abstração, solidão, concentração. Eu lia mais, pesquisava mais, andava pela cidade observando e formando o que se tornaria uma análise crítica de assuntos tão diversos quanto os que vocês podem ver (ler) desde a primeira postagem, em Dezembro de 2006.

Talvez essa minha limitação, essa minha incapacidade, tenha servido para aumentar meu respeito e admiração por aqueles que melhor escrevem, que mais produzem a arte textual.

Recentemente houve proposta, muito honrosa, especial e que me deixou lisonjeado, de usar essa minha admiração e respeito para atuar profissionalmente, de forma remunerada inclusive. Como ainda não se concretizou, não entrarei em detalhes. Mas são coisas que a arte oferece.

A limitação sobre a qual me referi acima se agrava por uma dificuldade que tenho em memorizar e abstrair. Isso mesmo! Minha memória é algo lamentável. O que se torna mais preocupante com o passar dos anos :)

Por sua vez, minha abstração não se limita a algo intelectual ou filosófico. Abstrair, no meu caso, requer que uma séria de características físicas, ambientas e emocionais estejam em profunda congruência. É quase uma utopia!

Por isso, me protejo sob o manto do amadorismo. Sou um blogueiro-escritor amador.

Essa, digamos, reflexão sobre a escrita se tornou uma constante em minha vida. Porém, recentemente me sinto mais instigado a pensar sobre isso, pois estou cada vez mais admirado com a capacidade e até brilhantismo com que alguns escrevem. Para ser mais específico, cito um livro denso em seu volume (são quase mil páginas) escrito por Ana Maria Gonçalvez. Trata do romance “Um defeito de cor”.

A personagem principal, narradora (e escritora, pois é a história de uma história) chama-se Kahinde. E, quanto mais me aproximo das últimas páginas (neste momento estou na página 917) mais sinto um misto de medo e saudades por chegar ao fim deste romance e não mais acompanhar a vida desta personagem. Este sentimento, confuso e estranho, eu confesso, me faz perceber o quão envolvente uma obra escrita pode ser. E a construção desta obra é algo que me impressiona. Quase mil páginas de coerência em uma história que nada tem de tediosa, que envolve, que instiga, que ensina, que desperta sentimentos extremos como o amor e o ódio, que emociona, que choca, que diverte...

Em parte do enredo, essa história épica lembra um pouco outro livro que me emocionou. “Negras Raízes” de Alex Haley. Lembro que sua leitura me fazia esquecer do demorado e desconfortável trajeto de casa ao trabalho e vice-versa. Foram muitos os livros que me ajudaram nesse momento da minha vida. E mesmo em casa, criando meu próprio mundo entre quatro paredes, me isolando de situações um tanto... destrutivas... Bem, mas o fato é que, numa das passagens desse incrível livro, foi impossível segurar as lágrimas, mesmo estando naquele ônibus lotado. Até hoje não sei se alguém percebeu. Tanto faz. A passagem a que me refiro foi quando o autor descreve a situação dos escravizados no navio negreiro, que sequestrou o personagem principal, Kunta Kinte, levando-o para o novo continente.

Essa narrativa que emociona, esse poder de construir textos que despertam tanta emoção, essa é a arte que mais admiro. E não falo apenas de romances. Textos jornalísticos, críticas, científicos, dentre outros, quando bem escritos, sempre despertam pelo menos minha admiração.

Bem, esta foi a maneira que encontrei para quebrar o silêncio. Espero que a inspiração esteja sempre presente, ou pelo menos seja mais constante, assim como a disposição para lançar mais palavras no TUIST.

A menina no mercado

Havia uma menina no mercado. Devia ter uns 12 anos. Talvez menos. Estava atrás de mim no caixa. Tinha dois pacotes de macarrão instantâneo n...