O que um episódio de Jornada nas Estrelas pode nos fazer refletir sobre
preservação no contexto informacional? Muita coisa!
Não posso me considerar um aficionado pela séria, embora goste muito da
temática. Ficção, tecnologia, espaço... a fronteira final.
Tantos séculos à frente e a referência ao passado é sempre constante.
Fatos, relatos, imagens... Até representações holográficas desse passado
remoto. Informação, preservada e acessível.
Há algum tempo fiz a seguinte pergunta a uma amiga: qual a data do
e-mail mais antigo que você ainda guarda? Sinceramente não me recordo da
resposta. No meu caso, o mais antigo datava de 4 de Abril de 2004. Quase dez
anos na ocasião da pergunta. Reparei que isso era e ainda é raridade. Hoje já
não tenho esse e-mail. Graças ao IG que parece ter deletado todo conteúdo de
minha conta, sem avisar. Hoje, o mais antigo que tenho data de 2006. Claro,
quando se tem um e-mail corporativo, numa empresa que se preocupa minimamente
com a preservação (mesmo que indiscriminada) por questões de negócio, é fácil encontrar
e-mail mais antigos. É a política do "arquiva tudo".
No caso de fotos é indiscutível que as mais antigas e ainda acessíveis
não estão em mídias digitais, mas em papel. Algumas pessoas até mesmo preservam
aqueles velhos filmes, bastando uma boa vista e uma fonte de luz para “acessar”
a informação ali registrada. Claro, aqui não considero os processo de digitalização para a acesso.
Mas será que em algumas décadas ainda teremos acesso a tais
informações? Ainda poderemos abrir um e-mail antigo, ler seu conteúdo,
recordar?
O fato é que as mídias mais seguras para preservação de longo prazo não
são os discos ópticos, não são os muitos pen-drives acumulados em nossas
gavetas, não são os cartões de “memória” de nossos celulares, câmeras
fotográficas, ou quaisquer outros dispositivos móveis.
O microfilme se destaca nesse quesito. Para muitos ultrapassados, mas
atualmente muito utilizado.
Não esqueçamos o retorno do disco de vinil. Para muitos, simples
saudosismo, onda retrô. Mas em termos de preservação é bem mais seguro que um
CD ou outra mídia usada popularmente para armazenamento de arquivo MP3, por exemplo.
Voltando ao filme…
Num dos episódios, Vulcano, o planeta natal do incrível personagem
Spock, é destruído. No filme, ele comenta algo, num tom de lamento. É mais ou
menos assim: “…mesmo que a essência de nossa cultura tenha sido preservada
pelos anciões…”.
O fato é que fica claro, naquela declaração, que não é a tecnologia,
não são as mídias, as responsáveis pela preservação do conhecimento daquele
povo. São os anciões.
Tal como os griôs nas sociedades africanas (pelo menos as mais
tradicionais) os anciões vulcanos têm esse importante papel: a preservação da
memória, principalmente por meio da disseminação.
Dito isso, vamos a análise crítica e as comparações para tentar emendar
essas duas linhas de raciocínio.
Já não temos mais disquetes. Os CD-ROMs são praticamente inexistentes.
Temos um ou mais pen-drives. Temos nossos cartões de memória em nossos
smartphones e/ou em quaisquer outros dispositivos móveis. São nossos espaços
locais. Temos também nossos espaços na nuvem, na clould. Este último, claro,
estamos terceirizando (Google, Amazon, Apple…) e raramente refletimos sobre como
nosso espaço está sendo cuidado. Ou, se deixarmos de “frequentar” esses espaços
virtuais durante algum tempo, quando retornarmos, será que “nossas coisas”
acessíveis? Normalmente só nos preocupamos quando, por algum problema técnico, nosso espaço na nuvem fica inacessível.
E como estamos cuidados de nossos espaços locais? Os guardamos em local
seguro? Fazemos migrações periódicas de maneira a mantermos os arquivos
acessíveis por programas atualizados? Eliminamos o desnecessário, as duplicações?
Fazemos verificações sobre a segurança dos arquivos, sua integridade, etc.?
E nossas mídias humanas? Como as tratamos? Nossos anciões, nossos velhos, nossos “mais
antigos”. Eles estão acessíveis? Ainda conseguimos “lê-los”? Estamos cuidados
deles de modo a preservar o que nos têm a oferecer? Estamos, de alguma forma,
registrando o que os guardiões da essência de nossa cultura nos transmitem?
E, por fim, temos consciência de que nós, os “não tão antigos”, os Spocks desse espaço,
também somos responsáveis pela preservação de nossa memória?