quarta-feira, dezembro 02, 2009

Informática e Informação: o acesso e o uso

Há poucos dias estive numa lan house, creio que pela terceira vez na vida. Apesar de focado num objetivo (pesquisa e impressão de legislação), não pude deixar de notar algo curioso, embora não tenha me surpreendido. O responsável pelo local, um rapaz com seus 17 ou 18 anos teve clara dificuldade em processos simples e primários de informática.

Utilização de e-mail online, impressão, utilização de múltiplas guias no navegador, abertura de arquivo, associação de arquivos com programas específicos. Foram muitas as situações naqueles poucos minutos, mas serviram para demonstrar a difícil relação entre o acesso e o uso de recursos informáticos.

Conheço pessoas que tiveram acesso a essa cobiçada e sonhada tecnologia quando para mim era apenas um sonho, e essas mesmas pessoas hoje têm dificuldade em operações simples como redigir um documento ou pesquisar na Internet.

Eu também aplaudo a tão aplaudida democratização da informática. A aparente estabilidade econômica e o preço de um computador básico hoje permitem que mais e mais pessoas usufruam desse bem de consumo [a propósito, leiam post recente]. Mas me parece que o fato de possuir esse "aparelho" não é garantia de nada. Quando muito de status (oh, eu tenho um micro em casa!). Me faz lembrar o termo Analfabetismo funcional.

Mas a questão também me chama atenção como Arquivista, pois posso traçar um paralelo entre o acesso e uso de recursos informáticos com o acesso e o uso da informação.

Se o acesso às informações públicas é condição para o exercício pleno da cidadania, nem sempre o puro acesso garante tal direito. Se o [bom] uso da informação não estiver consolidado, o exercício da cidadania também não o estará.

Aí entra a educação. Sem uma política educacional que vise realmente a democracia, a liberdade, o pensamento crítico, não existirá cidadão preparado para viver democraticamente, em liberdade e com visão crítica de sua realidade, podendo, então, exercer sua cidadania.

Com certeza isso não interessa aos "mandatários" da nação. Imaginem se cada brasileiro tivesse o nível de educação (notem que não falo de escolaridade) que descrevi acima.

Dezenas de milhões de pessoas cônscias de seus direitos e deveres. É o pior pesadelo dos políticos!

Por isso não podemos dissociar o acesso do uso. Tanto em termos informáticos (tecnologia) como informacionais (para cidadania).

Na história temos experiências que comprovam meu raciocínio. Analisemos o que ocorreu no continente africano. Além da política de dividir para dominar, aplicada pelos colonizadores europeus, houve outra forma de subjugação. O aparato burocratico imposto pelo colonizador, modelado numa realidade totalmente diferente, com bagagem cultural diferente, foi conduzido (comandado) não por africanos. Embora muitos africanos, ao longo daqueles anos, trabalhassem nos órgão de controle e diretamente ligados a esse "modelo de gestão européia", a cultura e a filosofia daquela gestão não era africana, tampouco o comando de fato.

Com isso, quando começou o processo de descolonização, além de nações artificialmente criadas e destruídas por anos de exploração, os colonizadores deixaram de herança um modelo de gestão exótico, um aparato burocrático estranho. E para o qual muitos africanos, apesar de executarem tarefas naquele ambiente, muito provavelmente não estavam de fato preparados. Isto é, a tecnologia estava em suas mãos (acesso), mas a operacionalidade de tal tecnologia, considerados os aspectos intrínsicos e extrínsicos ao Continente Africano, não estava consolidada (uso). Deu no que deu.


Paguei cinquenta centavos por meia hora e um real por cada folha impressa. Pelas dicas de informática eu não cobrei nada. Acessei e usei.

A propósito...

Veja o inciso XXXIII artigo 5° da Constituição Federal clicando
aqui
E a Lei 11.111 que o regulamenta, aqui.
Além disso temos o Projeto de Lei nº 5228/09 que visa regulamentar o acesso,
aqui.

Nenhum comentário:

A menina no mercado

Havia uma menina no mercado. Devia ter uns 12 anos. Talvez menos. Estava atrás de mim no caixa. Tinha dois pacotes de macarrão instantâneo n...